quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Semanário 'Movimento'



Mesmo entendendo o grupo em torno do jornal como sendo de oposição, é possível reconhecer que era acima de tudo aberto às posições heterogêneas.

Para entender como o semanário ‘Movimento’ realizou a cobertura das greves do ABC, é necessário retomar um pouco a formação deste veículo. Esta determina a sua linha editorial.
Movimento teve seu primeiro exemplar lançado no dia 7 de julho de 1975. Junto com o jornal Opinião e O Pasquim foi um dos importantes órgaos de imprensa durante a ditadura militar, reunindo diversos setores da intelectualidade brasileira, sendo um dos exemplos do que se chamava na época, imprensa alternativa.

O principal editor era o jornalista Raimundo Pereira e colaboradores importantes, dentre eles o o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o jornalista Duarte Pereira que mais tarde veio a trabalhar na famosa revista Realidade. Alguns participantes participaram na clandestinidade: Perseu Abramo, Chico Buarque de Holande, Chico Pinto, Fernando Paixoto e Elifas Andreato.

Mesmo composto por pessoas que se opunham veementemente à ditadura, o jornal fazia questão de preservar o jornalismo no seu sentido mais iluminista: a busca pela verdade. Para que isto ocorresse (atentemos para a palavra busca e não relato da verdade) seria necessário seguir o princípio básico do jornalismo: ouvir os dois lados da história.

Inicialmente pensamos que tal veículo se configuraria como panfletário. Mas as hipóteses que levantamos foram quebradas ao longo de nossas pesquisas.


Veja abaixo um pedaço da matéria que destacamos:

O que senti [diretor da fábrica Scânia] disse a um jornalista: Fiquei estupefato. Nunca tinha visto isso na minha vida.[...]

Matéria publicada na Revista Movimento em 22 de maio de 1978.

A fala foi relatada no semanário no dia 22 de maio. E, justamente por circular apenas uma vez por semana é que expandimos o nosso corpus. Fomos analisar nas demais semanas que se sucederam.
Em um outro parágrafo da mesma reportagem mencionada acima, a fonte do jornalista passa a ser o sindicalista Luis Inácio ‘Lula’ da Silva.


[..] Luis Inácio da Silva, o Lula,

garante que de nada sabia.

Um operário telefonou pra cá, avisando a gente.

Matéria publicada na Revista Movimento em 22 de maio de 1978.


O trecho em destaque nos mostra claramente a forma espontânea com que se deu a greve. Fábricas foram parando, jornais noticiando, operários se informavam e organizavam para parar suas fábricas também. Tal movimento do operariado é relatado ao longo da matéria usada como corpus deste trabalho.

Como tentamos mostrar a pluralidade de fontes como uma característica basilar do jornalismo praticado em Movimento. Utilizam-se de vozes oficiais, oficiosas e primárias – aqueles que vivem diretamente a experiência, seja como testemunha ocular ou participante ativa.

Como passar de uma semana, uma matéria de grande destaque no semanário foi uma denúncia à alemã Volkswagen. Intitulada por ‘A capitania da Volkswagen’ e assinada por Sérgio Buarque, a matéria trazia sérias acusações sobre a montadora alemã.



“A empresa alemã veio fabricar carros, mas hoje tem


uma capitania no Pará: 140 mil hectares,


para a criação de 110 mil bois.


E tudo é financiado pelo governo com


o dinheiro do nosso imposto de renda”.
Matéria publicada na Revista Movimento em 29 de maio de 1978.



O teor da matéria é todo em tom acusativo e investigativo. Para mostrar os reais interesses das empresas instaladas no ABC: lucrar com a mais-valia dos trabalhadores.

A importância dada ao fato histórico que se encorpava no ABC Paulista era tanta que as capas dos jornais em suma abordavam o assunto.
No caso mais específico, Movimento dava capas amplas e que funcionavam como incentivo à greve:

O verbo usado na placa é quase um convite aos demais trabalhadores: As fábricas param. Pare.

O movimento tornou concreta a máxima de Karl Marx: Trabalhadores do mundo uni-vos!

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